Doença renal policística é hereditária com formação de cistos renais, causando aumento gradual de ambos os rins, às vezes, com progressão para insuficiência renal. Quase todas as formas são provocadas por uma mutação genética familiar. Os sinais e sintomas incluem dor nos flancos e abdominal, hematúria e hipertensão. O diagnóstico é feito por TC ou ultrassonografia. O tratamento é sintomático, antes da insuficiência renal, e com diálise ou transplante, depois.
Doença renal policística é hereditária com formação de cistos renais, causando aumento gradual de ambos os rins, às vezes, com progressão para insuficiência renal. Quase todas as formas são provocadas por uma mutação genética familiar. Os sinais e sintomas incluem dor nos flancos e abdominal, hematúria e hipertensão. O diagnóstico é feito por TC ou ultrassonografia. O tratamento é sintomático, antes da insuficiência renal, e com diálise ou transplante, depois.
Etiologia da doença renal policística autossômica dominante
A herança da doença renal policística (DRP) é
Autossômico dominante
Recessiva
Esporádica (rara)
A doença renal policística autossômica dominante tem incidência de 1/1.000, sendo responsável por 5% dos indivíduos com doença renal em estágio terminal que exibem tratamento de substituição renalo. As manifestações clínicas são raras antes da idade adulta, mas a penetrância é essencialmente completa; todos os pacientes com ≥ 80 anos de idade apresentam algum sinal.
Ao contrário, a doença renal policística autossômica recessiva é rara; a incidência é de 1/10.000. Com frequência, causa insuficiência renal na infância. Oitenta e 86 a 96% dos casos de doença renal policística autossômica dominante são causados por mutações no gene PKD1 no cromossomo 16, que codifica a proteína policistina 1; a maioria dos outros casos é causada por mutações no gene PKD2 no cromossomo 4, que codifica a policistina 2. Poucos casos familiares não estão relacionados com um desses locus.
Fisiopatologia da doença renal policística autossômica dominante
A policistina 1 pode regular a adesão e a diferenciação das células epiteliais tubulares; a policistina 2 pode agir como um canal de íons, com mutações causando secreção de líquido nos cistos. As mutações dessas proteínas podem alterar as funções dos cílios renais, que permitem às células tubulares perceberem as velocidades de fluxo. A hipótese mais aceita propõe que a proliferação e a diferenciação das células tubulares estejam relacionadas com a velocidade de fluxo e disfunção ciliar, podendo assim causar transformação cística. A vasopressina promove o crescimento celular e a secreção de líquidos pela via do AMP cíclico, o que leva ao aumento do tamanho e da quantidade de cistos na doença renal policística.
No início da doença, os túbulos dilatam-se e enchem-se lentamente de filtrado glomerular. Com o tempo, os túbulos se separam do néfron funcionante e são preenchidos por líquido secretado e não filtrado, formando cistos. Pode ocorrer hemorragia nos cistos, causando hematuria. Os pacientes também têm maior risco de pielonefrite aguda, infecções císticas e cálculos urinários (em 20%). A esclerose vascular e a fibrose intersticial acabam ocorrendo por mecanismos desconhecidos e normalmente afetam < 10% dos túbulos; todavia, o desenvolvimento de insuficiência renal ocorre em cerca de 35 a 45% dos pacientes ao redor dos 60 anos de idade.
As manifestações extrarrenais são comuns:
Cistos hepáticos estão presentes na maioria dos pacientes; em geral, não afetam a função hepática.
Os pacientes também apresentam maior incidência de cistos pancreáticos e intestinais, divertículos de cólon e hérnias inguinais e da parede abdominal.
Doenças valvares cardíacas (com mais frequência o prolapso de valva mitral e a regurgitação aórtica) podem ser detectadas por ultrassonografia cardíaca (ecocardiograma) em 25 a 30% dos pacientes; outras alterações valvares podem ser causadas por anomalias do colágeno.
A regurgitação aórtica resulta da dilatação da raiz da aorta em decorrência de alterações da parede arterial (incluindo aneurismas da aorta).
Podem ocorrer aneurismas das coronárias.
Aneurismas cerebrais estão presentes em cerca de 4% dos adultos jovens e em até 10% dos pacientes idosos. Os aneurismas rompem-se em 65 a 75% dos pacientes, geralmente antes dos 50 anos de idade; os fatores de risco incluem história familiar de aneurisma ou de ruptura, aneurismas grandes e hipertensão mal controlada.
Sinais e sintomas da doença renal policística autossômica dominante
A doença renal policística autossômica dominante (DRPAD) geralmente não causa sintomas inicialmente; metade dos pacientes permanece assintomática, nunca apresenta falência ou insuficiência renal e nunca é diagnosticada. A maioria dos pacientes que desenvolve sintomas o faz no final dos 20 anos de idade.
Sintomas incluem dor fraca no flanco, no abdome e na região lombar decorrente do aumento dos cistos e sintomas de infecção. Dor aguda, quando presente, geralmente decorre de hemorragia nos cistos ou elominação de um cálculo. Febre é comum com pielonefrite aguda, e ruptura dos cistos no espaço retroperitoneal pode causar febre que pode durar semanas. Os cistos hepáticos podem causar dor no hipocôndrio direito caso aumentem de tamanho ou tornem-se infectados.
Doenças valvulares raramente causam sintomas, mas ocasionalmente ocorre insuficiência cardíaca e é necessária a substituição valvular.
Os sinais e sintomas de aneurisma cerebral intacto podem estar ausentes ou podem incluir cefaleia, náuseas e vômitos e deficits de pares cranianos; estes tornam necessária a intervenção imediata.
Os sinais são inespecíficos e incluem hematúria e hipertensão (cada uma em cerca de 40 a 50%) e, em 20% dos pacientes, proteinúria no intervalo subnefrótico (< 3,5 g/24 h em adultos). Anemia é menos comum do que em outros tipos de doença renal crônica, presumivelmente porque a produção de eritropoetina é preservada. Na doença avançada, os rins podem se tornar muito palpáveis, causando sensação de preenchimento na porção superior do abdome e no flanco.
Diagnóstico da doença renal policística autossômica dominante
Ultrassonografia
Algumas vezes, TC ou RM ou exames genéticos
O diagnóstico da doença renal policística é suspeitado em pacientes com os seguintes:
História familiar positiva
Sintomas ou sinais típicos
Cistos detectados incidentalmente em exames de imagem
Os pacientes devem ser aconselhados antes de serem submetidos a exames diagnósticos, particularmente se forem assintomáticos. Por exemplo, muitos especialistas não recomendam os exames em pacientes jovens assintomáticos já que não existe nenhum tratamento eficaz nessa faixa etária e o diagnóstico tem efeitos potenciais negativos no humor e na capacidade de obter seguro de vida em termos favoráveis.
O diagnóstico geralmente é feito através de exames de imagem, mostrando alterações císticas bilaterais e extensas nos rins, que tipicamente estão aumentados e têm uma aparência de roído por traças em decorrência do deslocamento do tecido funcional pelos cistos. Essas alterações desenvolvem-se com a idade e são menos frequentes ou óbvias em pacientes mais jovens.
Em geral, realiza-se inicialmente a ultrassonografia. Para pacientes com história familiar de DRPAD, usam-se critérios ultrassonográficos (de acordo com a idade e a quantidade de cistos renais) para diagnosticar ou excluir DRPAD. Os critérios de imagem em pacientes com história negativa ou desconhecida não foram estabelecidos. Frequentemente realizam-se TC ou RM após o estabelecimento do diagnóstico de DRPAD. A TC e a RM são mais sensíveis do que a ultrassonografia na detecção de cistos e podem ser úteis em casos duvidosos e para medir o volume renal e do cisto, o que pode ter implicações prognósticas.
Exame de urina, testes de função renal e hemograma completo são realizados, mas os resultados são inespecíficos.
Doença policística renal: Incidência axial na TC de rins policísticos
O exame de urina detecta proteinúria leve e hematúria micro ou macroscópica. Hematúria franca pode ser causada por passagem de cálculo ou por hemorragia de cisto roto. Piúria é comum mesmo sem infecção bacteriana; assim, o diagnóstico da infecção deve basear-se em resultados de cultura e resultados clínicos (p. ex., disúria, febre, dor lombar), assim como exame de urina. Inicialmente, a ureia e a creatinina são normais ou levemente aumentadas, mas aumentam de maneira lenta. Raramente, o hemograma detecta policitemia.
Pacientes com sintomas de aneurisma cerebral exgiem tomografia computadorizada de alta resolução ou angiografia por TC. Mas a maioria dos especialistas não recomenda a triagem de rotina para aneurisma cerebral em pacientes assintomáticos. Uma abordagem razoável é rastrear os pacientes com doença renal policística autossômica dominante que têm história familiar conhecida de acidente vascular encefálico hemorrágico ou aneurisma cerebral.
Atualmente, reserva-se o teste genético à procura de mutações da doença renal policística (DRP) aos seguintes:
Pacientes com suspeita de DRP sem história familiar
Pacientes com resultados inconclusivos nos exames de imagem
Pacientes mais jovens (p. ex., idade < 30 anos, em que os exames de imagem geralmente são inconclusivos), nos quais o diagnóstico deve ser realizado (p. ex., doador de rim em potencial)
O aconselhamento genético é recomendado para parentes de 1º grau de pacientes com doença renal policística autossômica dominante.
Tratamento da doença renal policística autossômica dominante
Controle das complicações (p. ex., hipertensão, infecção, insuficiência renal)
Medidas de suporte
Antagonismo ou supressão da vasopressina
É essencial um estrito controle da hipertensão. Tipicamente, um inibidor da ECA (enzima conversora de angiotensina) ou um bloqueador do receptor de angiotensina é usado. Além de controlar a pressão arterial, esses fármacos ajudam a bloquear a angiotensina e aldosterona, fatores de crescimento que contribuem para a cicatrização renal e perda da função renal. As infecções do trato urinário devem ser tratadas imediatamente. A aspiração percutânea dos cistos pode ajudar a aliviar dor grave decorrente de hemorragia ou compressão, mas não tem efeito no resultado a longo prazo. Nefrectomia é uma opção para aliviar os sintomas graves decorrentes de aumento maciço do rim (p. ex., dor, hematúria) ou infecções do trato urinário recidivantes.
A hemodiálise, a diálise peritoneal ou o transplante renal são necessários em pacientes que desenvolvem insuficiência renal crônica. A doença renal policística autossômica dominante não recidiva em transplantes.
Medidas de suporte incluem maior ingestão de líquidos (particularmente água) para suprimir a liberação de vasopressina, mesmo que apenas parcialmente, em pacientes que conseguem excretar com segurança o volume ingerido.
Tolvaptano, um antagonista do receptor 2 de vasopressina, é um fármaco que pode beneficiar pacientes com doença renal policística autossômica dominante (1, 2). Tolvaptano parece desacelerar o aumento do volume renal e o declínio da função renal, mas pode causar efeitos adversos via diurese de água livre (p. ex., sede, polidipsia, poliúria) que podem dificultar a adesão. Relatou-se que o tolvaptano causa insuficiência hepática grave e, consequentemente, é contraindicado em pacientes com comprometimento ou lesão hepática signicativa. Tolvaptano pode ser especialmente benéfico para pacientes com maior risco de progressão rápida da doença renal. É recomendado consulta com um especialista antes de iniciar o tolvaptano devido aos potenciais efeitos adversos. Tolvaptano não foi estudado em crianças e não é recomendado naqueles < 18 anos de idade.
Em crianças com doença renal policística autossômica dominante, o uso precoce da pravastatina pode desacelar a progressão da doença renal estrutural (3).
Referências sobre o tratamento
1. Torres VE, Chapman AB, Devuyst O: Tolvaptan in patients with autosomal dominant polycystic kidney disease. N Engl J Med 367(25):2407-2418, 2012. doi: 10.1056/NEJMoa1205511
2. Torres VE, Chapman AB, Devuyst O: Tolvaptan in later-stage autosomal dominant polycystic kidney disease. N Engl J Med 16;377(20):1930-1942, 2017. doi: 10.1056/NEJMoa1710030
3. Cadnapaphornchai MA, George DM, McFann K, et al: Effect of pravastatin on total kidney volume, left ventricular mass index, and microalbuminuria in pediatric autosomal dominant polycystic kidney disease. Clin J Am Soc Nephrol 9(5):889-896, 2014.
Prognóstico da doença renal policística autossômica dominante
A insuficiência renal se desenvolve em 35 a 45% dos pacientes com doença renal policística autossômica dominante (DRPAD) aos 60 anos. Aos 75 anos de idade, 50 a 75% dos pacientes exigem tratamento de substituição renal (diálise ou transplante). Em média, a taxa de filtração glomerular (RFG) diminui em cerca de 5 mL/min/ano após a quarta década de vida. Os fatores preditivos de progressão rápida para insuficiência renal incluem:
Idade mais precoce no diagnóstico
Sexo masculino
Traço falciforme
Genótipo PKD1
Volume renal maior ou que aumenta rapidamente
Hematúria macroscópica
Hipertensão
Etnia negra
Aumento da proteinúria
Medições do volume renal e cistos preveem o risco de progressão para doença renal crônica e doença renal em estágio final, muitas vezes antes das alterações nos estudos laboratoriais de rotina. Por exemplo, o tamanho do cisto e o tamanho do rim preveem o risco da doença renal crônica em 8 anos com mais precisão do que a idade, grau de proteinúria ou ureia ou creatinina sérica. O tamanho do rim é o preditor mais importante da progressão, particularmente um volume renal total > 1500 mL (1).
Associou-se a elevação do fator de crescimento de fibroblastos hormonais fosfatúricos (FGF) 23 ao aumento do tamanho do rim e à taxa anualizada de declínio da taxa de filtração glomerular estimada (TFGe), mas, curiosamente, isso não aumentou a previsão do risco para a progressão da doença (2).
DRPAD não aumenta o risco de câncer renal, mas nos pacientes com DRPAD que o desenvolvem há maior probabilidade de o câncer ser bilateral. O câncer renal raramente causa morte. Os pacientes geralmente morrem devido a doença cardíaca (algumas vezes valvular), infecção disseminada, ou aneurisma cerebral roto.
Referências sobre prognóstico
1. Grantham JJ, Torres VE, Chapman AB, et al: Volume progression in polycystic kidney disease. N Engl J Med 18;354(20):2122-2130, 2006. doi: 10.1056/NEJMoa054341
2. Chonchol M, Gitomer B, Isakova T, et al: Fibroblast growth factor 23 and kidney disease progression in autosomal dominant polycystic kidney disease. Clin J Am Soc Nephrol 12(9):1461-1469, 2017. doi: 10.2215/CJN.12821216
Pontos-chave
Doença renal policística autossômica dominante ocorre em cerca de 1/1000 pessoas.
Cerca de metade dos pacientes não apresentam manifestações, mas outros sintomas de dor lombar ou abdominal, hematúria e/ou hipertensão se desenvolvem gradualmente, geralmente com início antes dos 30 anos; 35 a 45% desenvolvem insuficiência renal aos 60 anos de idade.
As manifestações extrarrenais são comuns e incluem aneurismas arteriais cerebrais e coronarianos, doença valvar cardíaca e cistos no fígado, pâncreas e intestinos.
Diagnosticar a DRP com base em estudos de imagem e achados clínicos, reservando exames genéticos para pacientes sem história familiar ou com resultados inconclusivos nos exames de imagem, ou em pacientes jovens quando os resultados podem afetar a elegibilidade do doador renal. Recomenda-se obter a opinião de especialistas é antes de realizar exames genéticos por causa de várias implicações.
Não triar rotineiramente pacientes assintomáticos para doença renal policística autossômica dominante ou pacientes assintomáticos com doença renal policística autossômica dominante para aneurismas cerebrais.
Fornecer aconselhamento genético para parentes de 1º grau de pacientes com doença renal policística autossômica dominante.
Administrar inibidores da ECA ou bloqueadores dos receptores da angiotensina para hipertensão e a fim de ajudar a evitar disfunção e cicatrizes renais; tratar outras complicações que possam surgir e considerar o uso de tolvaptano.
Por
, MD, MPH, Loma Linda University School of Medicine
Avaliado clinicamente abr 2023